Capítulo 12
Gestão com recurso a cirurgia ortopédica
QUANDO É INDICADO OPERAR A RETRAÇÃO DO TENDÃO DE AQUILES NA DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE?
A. Ey Batlle
A retração do tendão de Aquiles é um problema comum nos doentes com DMD que vai aumentando com a evolução da doença. Sabe-se que o grau de retração pode ser de 0,4° por mês. A gestão desta e de outras retrações associadas à DMD deve ser sempre multidisciplinar e incluir o técnico de reabilitação, o técnico ortopédico, o fisioterapeuta, o neurologista e o cirurgião ortopedista. Quando o tratamento envolve também uma cirurgia, a avaliação do pneumologista, do cardiologista e do anestesista é vital.
O tratamento conservador com fisioterapia, talas noturnas ou gessos é útil, mas embora possa retardar a evolução da retração, a deformação em equino ou em equinovaro é uma constante na evolução destes doentes1-3.
Quando o tratamento conservador não consegue controlar a doença, a cirurgia deve ser ponderada.
As indicações para o tratamento cirúrgico em DMD podem ser resumidas em três:
De todas estas situações, a mais frequente é a adaptação a talas para conseguir um pé plantígrado.
O tratamento cirúrgico da retração que deforma em equino é o alongamento do tendão de Aquiles e, quando acrescem outras deformidades, pode ser necessário efetuar uma tenotomia da tíbia posterior ou uma fasciectomia ou tenotomia dos flexores trifalângicos dos dedos. Após a cirurgia, as talas devem ser colocadas o mais rapidamente possível.
Cirurgias
QUANDO É INDICADA A CIRURGIA DA ESCOLIOSE NA DMD?
I. Vilalta Vidal
A escoliose na DMD é geralmente progressiva e pode aumentar entre 16 e 24° por ano4, necessitando de tratamento cirúrgico para ser corrigida. É difícil decidir quando realizar o tratamento cirúrgico. Não existem estudos aleatórios ou diretrizes terapêuticas para a sua indicação e nem todos desenvolverão escoliose na mesma idade e com a mesma evolução. Este facto, acrescido do facto de a incidência da escoliose ter diminuído, com o uso de glucocorticoides, de 90 para 30%5, torna a cirurgia controversa nestes doentes6.
Em geral, a indicação para o tratamento cirúrgico é a deformação inaceitável progressiva com desequilíbrio do tronco ou a obliquidade pélvica (OP) que impede a sedestação. A cirurgia precoce é essencial em alguns doentes esqueleticamente imaturos, porque a deformidade geralmente continua a progredir, ou naqueles cuja função respiratória ou cardíaca preveja que uma cirurgia posterior não seria viável. Nestes casos, sugere-se a realização da cirurgia a partir de um ângulo Cobb > 20°. Estaria também indicada em doentes pré-púberes sem uso de glucocorticoides com ângulos > 20°, devido à probabilidade de progressão. Os doentes em tratamento com glucocorticoides também podem desenvolver escoliose, sendo recomendada a cirurgia em casos de progressão. Da mesma forma, no doente esqueleticamente maduro, a cirurgia dependerá da evolução da curva, a qual, em muitos casos, permanece estável e não requer tratamento5,7. A técnica recomendada é a artrodese/fusão posterior que, normalmente, requer extensão proximal até T2-T4 para evitar a cifose proximal e manter o centro cefálico para a frente. A seleção do nível distal, de acordo com alguns autores, seria L5, quando a cirurgia é realizada precocemente, e em ângulos Cobb < 40° e OP < 10°, mas a maioria recomenda a sua extensão até à pélvis e particularmente quando o ápice da curva está abaixo de L1. Em crianças esqueleticamente imaturas, as técnicas de não fusão devem ser ponderadas8.
Aconselhamos acompanhar de perto a escoliose em doentes com DMD e avaliar individualmente o tratamento em cada caso. Uma equipa multidisciplinar é de grande importância para avaliar a necessidade de cirurgia, o melhor momento para a cirurgia e para otimizar o doente para a cirurgia.
BIBLIOGRAFIA
1. Glanzman AM, Flickinger JM, Dholakia KH, Bönnemann CG, Finkel RS. Serial casting for the management of ankle contracture in Duchenne muscular dystrophy. Pediatr Phys Ther. 2011;23(3):275-79.
2. Birnkrant DJ, Bushby K, Bann CM, Alman BA, Apkon SD, Blackwell A, et al. Diagnosis and management of Duchenne muscular dystrophy, part 2: respiratory, cardiac, bone health, and orthopaedic management. Lancet Neurol. 2018;17(4):347-61.
3. Nishizawa H, Matsukiyo A, Shiba N, Koinuma M, Nakamura A. The effect of wearing night splints for one year on the standing motor function of patients with Duchenne muscular dystrophy. J Phys Ther Sci. 2018;30(4):576-9.
4. Archer JE, Gardner AC, Roper HP, Chikermane AA, Tatman AJ. Duchenne muscular dystrophy: the management of scoliosis. J Spine Surg 2016;2(3):185-94.
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7. Yang JH, Kim KS, Lee GH, Kim HS. Comparison of survival analysis between surgical and non-surgical treatments in Duchenne muscular dystrophy scoliosis. Spine J. 2020;20(11):1840-9.
8. Murphy RF, Mooney 3rd JF. Current concepts in neuromuscular scoliosis. Curr Rev Musculoskelet Med. 2019;12(2):220-7.